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Bolsonaro será preso após julgamento no STF? Vai cumprir pena no quartel ou ficará em casa?

A jurista Jacqueline Valles, mestre em Direito Penal, detalha os cenários de prisão, regalias e as complexas batalhas de recursos que se desenrolam a partir de uma eventual condenação

O Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para um dos julgamentos mais aguardados da história recente do Brasil. A partir de 2 de setembro, a Primeira Turma da Corte julgará a ação penal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus acusados de tramarem um golpe de Estado. Em caso de condenação, a pergunta que ecoa é: o que realmente acontece com o ex-presidente? 

Bolsonaro responde por uma série de crimes graves: abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, associação criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. As penas somadas podem ultrapassar 40 anos de reclusão. O julgamento ocorrerá na Primeira Turma, composta pelos ministros Alexandre de Moraes (relator), Flávio Dino, Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Luiz Fux. Ao lado de Bolsonaro no banco dos réus estarão figuras centrais de seu governo, como os generais Braga Netto e Augusto Heleno, e o ex-ministro Anderson Torres.

A advogada criminalista Jacqueline Valles, mestre em Direito Penal com mais de 30 anos de experiência, explica que, diferentemente do que acontece nos filmes, Bolsonaro não será preso caso seja condenado. “A condenação não significa algemas na saída do plenário. A prisão imediata não é automática e dependerá de um pedido específico da Procuradoria-Geral da República, que precisará ser acatado pela maioria dos ministros. Eles podem entender que Bolsonaro pode aguardar os recursos em liberdade ou em prisão domiciliar”, esclarece Jacqueline Valles. 

Definição sobre a forma como cumprirá pena só virá após o trânsito em julgado, ou seja, quando esgotarem os recursos jurídicos da defesa. Isso pode acontecer tanto no final deste ano, quanto no ano que vem. “É difícil precisar um prazo para que isso ocorra porque há muitas variáveis que podem influenciar”. 

O jogo não acaba no julgamento
Embora o STF seja a última instância, a defesa de Bolsonaro possui um arsenal jurídico robusto para contestar uma condenação. “O sistema recursal no STF, embora limitado, oferece mecanismos que podem prolongar significativamente o desfecho final. A primeira linha de defesa, quase automática, são os Embargos de Declaração”, explica a jurista. Se a defesa alegar que os ministros deixaram de analisar um ponto crucial, como a validade da delação de Mauro Cid, pode usar este recurso para suspender os efeitos da decisão. 

No entanto, a estratégia mais promissora para a defesa são os Embargos Infringentes. “Este é o recurso que pode mudar completamente o jogo. Se apenas houver divergência em dois pontos da condenação, a defesa pode levar a discussão para o Plenário, ou seja, para todos os ministros da Corte. Considerando a complexidade do caso, uma divergência é um cenário perfeitamente plausível”, revela Valles.

Ela alerta, porém, para uma limitação: o recurso fica restrito ao ponto da divergência. “Se um ministro absolver Bolsonaro apenas do crime de associação criminosa, por exemplo, é somente sobre este crime que os demais ministros poderão debater. Não se pode reabrir a discussão sobre todos os outros.” 

Prisão só depois do trânsito em julgado
Se condenado a prisão em regime fechado, para onde Bolsonaro seria levado? A defesa certamente invocaria a prerrogativa de Bolsonaro como capitão reformado do Exército para solicitar uma Sala de Estado-Maior, separada de presos comuns. Contudo, a possibilidade de cumprimento em presídio federal ou estadual não está descartada, já que foi condenado por tramar um golpe de estado com militares. 

E a tão falada prisão domiciliar? A advogada é taxativa ao explicar que há regras rígidas no Código de Processo Penal. “Não basta ter mais de 80 anos; a lei exige que a pessoa esteja extremamente debilitada por doença grave. A idade por si só não é um passaporte para cumprir pena em casa. O fator clínico é decisivo. Ele pode ter 120 anos, mas se estiver com a saúde estável, a regra é o presídio”, afirma Valles. 

Se condenado a uma pena máxima hipotética de 43 anos, Bolsonaro poderia passar cerca de 7 anos em regime fechado, segundo a Lei de Execução Penal, que prevê a progressão de regime após o cumprimento de 16% da pena para crimes sem violência cometidos por réu primário. “Se houver condenação e recursos, o trânsito em julgado, que é a decisão final e definitiva, pode se arrastar até o final de 2025 ou início de 2026. Estamos diante de uma maratona jurídica que está apenas começando”, completa.