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Vou ser direto: quando o Estado decide que 𝗱𝘂𝗮𝘀 𝗵𝗼𝗿𝗮𝘀 𝗱𝗲 𝗽𝗿𝗮́𝘁𝗶𝗰𝗮 𝘀𝗮̃𝗼 𝘀𝘂𝗳𝗶𝗰𝗶𝗲𝗻𝘁𝗲𝘀 𝗽𝗮𝗿𝗮 𝗮𝗹𝗴𝘂𝗲́𝗺 𝗽𝗲𝗴𝗮𝗿 𝘂𝗺 𝗰𝗮𝗿𝗿𝗼 𝗲 𝘀𝗮𝗶𝗿 𝗱𝗶𝗿𝗶𝗴𝗶𝗻𝗱𝗼, ele não está só mudando uma regra. Ele está mudando a mensagem. E mensagem, em política pública, pesa mais do que parece.
Porque, no fim das contas, o que essa decisão comunica? “Dirigir é simples.” “Aprender? Depois você vê.” “Risco? Não exagera.”
Só que o trânsito não funciona nesse tom de leveza. O trânsito é um organismo cheio de variáveis, cheio de gente, cheio de erros humanos esperando um segundo de descuido para virar estatística.
E, veja, falo isso depois de anos estudando percepção pública e crises: toda vez que você reduz o rigor de um processo que protege vidas, você não democratiza. Você fragiliza. E fragilidade em larga escala sempre volta em forma de problema coletivo.
A formação de motoristas no Brasil já patina com vinte horas práticas. Com duas? É quase um ato de fé. E fé não substitui método. Nem prepara ninguém para reagir ao inesperado, conviver com o caos, antecipar risco — tudo aquilo que constrói um motorista de verdade.
E tem um ponto que me incomoda ainda mais: a reputação institucional. Se o governo diz que está “ampliando acesso”, ótimo. Mas ampliar acesso sem ampliar proteção? Isso abre uma rachadura perigosa entre discurso e realidade. E quando essa rachadura aparece, o público interpreta como descuido. E percepção, você sabe, move montanhas. E também mata.
Fico pensando no que vai acontecer quando os números começarem a subir. Quando acidentes envolvendo recém-habilitados aumentarem. Quando as manchetes começarem a cobrar explicações.
E aí? Quem responde? Quem segura essa conta? Porque, no trânsito, a crise nunca chega de surpresa. Ela começa antes. Lá no detalhe que alguém decidiu ignorar.
Clareza protege. E, nesse caso, faltou clareza. Faltou método. Faltou responsabilidade narrativa.




